Liberdade – Jonathan Franzen

“Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância.”(Simone de Beauvoir)

 Uma família perfeita é o que grande parte da população quer, seja pelo status social, pela estabilidade de se manter um lar ou seja por amor. Os Berglunds são uma dessas famílias perfeitas. Patty é mãe de dois filhos e dona-de-casa que desistiu de sua carreira no basquete universitário. Seu marido, Walter, é um homem íntegro e de ideologias inabaláveis sobre o crescimento populacional e o meio ambiente. Eles tiveram dois filhos: Joey, um menino que desde pequeno mostrava grande ambição e inteligência, e Jéssica, uma menina calma e interessada em livros e arte. Richard Katz, melhor amigo de Walter, é um músico que após anos no ostracismo alcança uma fama indesejada. Walter, Patty e Richard se conheceram no fim dos anos 1970, na Universidade de Minnesota.

No entanto, os Berglunds estão à beira de um colapso, onde o matrimônio é uma farsa recheada de mentiras e aparências, e a criação dos filhos não é apenas centrada no amor. Aliás, amor em demasia (ou a ilusão da existência desse) por parte de alguns personagens é o que constrói essa imagem de perfeição em ruínas.

É um romance simples, com personagens críveis e tridimensionais – Patty e sua obsessão, loucura aparente e seus traumas (que chegam a ser irritantes quando inconscientemente ela dá mais atenção a Joey do que Jessica), Richard Katz e sua atitude de rockstar caricato, Joey e sua ambição alimentada por alguma inocência, todos com altos e baixos, grandes defeitos, qualidades, fobias, etc. Franzen ainda nos presenteia com uma narrativa que ora nos faz torcer por um personagem, ora sentirmos repulsa por suas convicções.

O momento em que cada um dos personagens principais sente sua verdadeira libertação não é descrito, mas percebido, ou sentido, pelo leitor: a lição que cada um sofre para aprender. Essa experiência, nunca articulada pelos personagens, aparece apenas no diário de Patty. Franzen descreve com cinismo como os desejos mais prementes estão apenas encobrindo alguma outra insatisfação e podem mudar num instante, e sugere que obter exatamente o que se quer pode causar incerteza e desilusão. A cada nova fase da vida de cada um, vemos que essa pretensão invisível é repleta de traições, dúvidas, sexo, confrontamentos e muitas decepções. Situações que chegam a um extremo quase sem saída.


Num primeiro momento, pode-se imaginar que se trata de um dramalhão, mas o autor se sai muito bem com diálogos carregados de realismo com palavras de baixo calão, discussões por vezes vazias, embora recheadas de um humor irreverente. A narrativa é totalmente atrativa: ganchos ao final de cada parte que não se ligam diretamente à próxima, mas que instigam o leitor a continuar na história e saber onde cada decisão levará seus personagens. Franzen pergunta se liberdade quer dizer libertar-se de alguma coisa ― responsabilidade, medo, dor, sociedade de consumo ―, ou se liberdade é para alguma coisa decisiva ― constituir família, carreira, um mundo melhor.

Ao fim da leitura, talvez seja possível refletir se a busca incessante por liberdade realmente tem um fim ou se todos estão condenados a permanecer no ciclo vicioso dessa jornada. Por mais que o desfecho soe como um final feliz para quase todos, na verdade transparece uma condição: os homens são eternos insatisfeitos, mas alimentados por esperanças de um futuro melhor.

Publicado em 21/12/2011, em Boa Leitura e marcado como , , , , , . Adicione o link aos favoritos. Deixe um comentário.

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