A VISITA CRUEL DO TEMPO – Jennifer Egan

Eu estou acabado. Estou velho, estou triste… e isso em um dia bom.
Eu quero sair fora disso tudo. Mas não me encolher em um canto,
quero ir embora em grande estilo: quero que a minha morte seja uma
atração, um espetáculo, um mistério. Uma obra de arte.

A Visita Cruel do Tempo é um livro impressionante e surpreendente. Tinha tudo para ser confuso, mas a autora soube trabalhar bem a narrativa, fazendo com que os leitores tenham uma experiência intensa a cada página.

Cada segmento é narrado por uma voz mais virtuosa que a outra, avançando e recuando na cronologia para cobrir cinco décadas e tendo como pano de fundo uma reflexão sobre os estragos provocados pela passagem cruel do tempo na vida dos personagens e da própria cultura americana.

 Apesar de não possuir uma ordem corno lógica clara, é possível definir alguns marcos importantes. O mais antigo fica nos anos 1970 em que o quarentão Lou, produtor musical de sucesso, cheirador e sedutor de garotinhas, aparece ao longo de dois capítulos num safári na África e esbarrando, por meio de uma nova conquista amorosa, com uma turma de jovens punks de São Francisco, já no limiar dos 1980. Dessa galera fazem parte Bennie, destinado a se tornar discípulo de Lou e surfar a indústria musical até ser tragado pela era digital, e Scotty, um guitarrista brilhante, maluco e fracassado que se tornará um improvável ídolo dos bebês – o novo público-alvo do pop – em algum momento depois de 2020.

Entre uma ponta e outra, entre a tragédia e a comédia rasgada, a sátira de costumes e o drama psicológico, a narração se alterna entre a primeira, a terceira e até a segunda pessoa. Personagens vêm e vão, ora são coadjuvantes numa história, ora são protagonistas em outra, tudo isso sem que o leitor se perca no meio dessa confusão de gente.

Tempo é um assunto que assusta, na mesma medida que fascina a maioria das pessoas. Ninguém quer ficar velho. Ninguém imagina como é ficar velho ou como será sua vida ao envelhecer.

Jennifer Egan apresenta a história de forma tão crua e real que beira o melancólico. Não há espaço para o romance idealizado, pois estamos falando de vida. Pessoas que cometem erros, que não pedem perdão e que continuam a viver sua vida da maneira mais medíocre possível. Mas nem tudo é sombrio. Há os momentos de humor e de um beleza encantadora, quase ingênua.

Essa é a dosagem perfeita do livro – que não te deixa deprimido, mas te faz refletir, não sobre o tempo futuro e sua ação desenfreada, mas pelo o que você está fazendo exatamente neste instante. O mundo está em constante mudança e as pessoas também, de forma que nada acaba sendo como planejamos. É uma verdadeira desconstrução do tempo, onde só existe o agora.

A Visita Cruel do Tempo é um livro diferente e merecedor do Pulitzer de 2011 na categoria Ficção. O livro possui um capítulo feito só em slide, nunca tinha visto um livro com esse detalhe e achei a ideia extremamente original e muito bem elaborada. Os slides expressam o ponto de vista de uma criança sobre a personalidade de cada um dos membros de sua família: pai, mãe e irmão. Interessantíssimo. Vale a pena dedicar alguns dias da nossa vida para apreciá-lo.

Há a intenção em transformá-lo numa séria de TV produzida pela HBO.

Publicado em 11/04/2012, em Boa Leitura e marcado como , , . Adicione o link aos favoritos. Deixe um comentário.

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